Somos um projeto de nós mesmos?

Wallace Soares
3 min readMay 19, 2020

Acreditava, após entrar na faculdade, que cada oportunidade que pude agarrar para aprender algo novo deveria ser aproveitada. Eu sempre me dediquei a aprender coisas novas. Me dediquei até para coisas que saberia que não seriam utilizadas. Hoje, após ter convivido (até demais) no ambiente acadêmico e influenciado pelo ambiente corporativo percebo que ficamos um pouco viciados, mesmo que sem querer, a nunca parar. Nos tornamos uma grande máquina consumidora de conhecimento. Não me levem a mal, acho que devemos sempre estar atualizados nos nossos âmbitos de conhecimento. Mas até que ponto? E a qual custo?

Recentemente, incentivado por um amigo de colégio comecei a ler livros sobre as ciências humanas. Essa área nunca havia me demonstrado seu lado interessante. Sempre fui aluno/sujeito "exatas". Um dos autores que mais gostei por sua didática e simplicidade nas explicações foi Byung-Chul-Hang. Seus livros podem ser pequenos em páginas, mas são enormes em conteúdo e reflexão. Em seu livro "No enxame" ele trás uma idea que pode ser observada aos montes hoje nas redes sociais, neste texto, neste meio. O sujeito de hoje deixou de criar um projeto para vida e ele se tornou seu próprio projeto. Explico: o sujeito busca nada mais, nada menos que a máxima performance. Não aceita desculpas para a procrastinação e à abomina. Hoje, o que Byung-Chul-Hang chama de sujeito do desempenho, se tornou um projeto que precisa de resultados. Precisa entrega-los. Esse projeto tem como objetivo não a felicidade e a auto-realização, mas sim um projeto de futuro.

Eu estudo hoje, trabalho hoje, me dedico hoje para um dia no futuro aproveitar.

Só que o grande ponto do autor (escrever o nome completo dele da trabalho) é que esse futuro projetado não chega. Até para aqueles que teoricamente chegaram lá. O sujeito se torna refém de si mesmo. Auto-exploração e auto-otimização são seus mantras. Uma outra celebre citação deste livro é a seguinte:

"O Si como belo projeto se mostra como projétil, que ele, agora, aponta contra si mesmo."

Confesso aqui que até ler este livro e perceber esses pequenos detalhes, que eu chamo do "modo automático", tenho plena certeza de que vivia e vivo de em certa parte no mundo dos sujeitos do desempenho. Escrever este artigo, inclusive, eu diria que me encaixa nesse mundo.

Não estou aqui dizendo que não devemos fazer tarefas consideradas massantes. Elas fazem parte do nosso cotidiano. Isso é inclusive outra nuancia de outro livro dele, o Sociedade do Cansaço. Onde o excesso de positividade nos leva a uma sociedade que não sabe, simplesmente, lidar com a vida. Mas não vamos entrar neste assunto.

Ao final, o que concluo do livro é: não torne de você um projeto. Não esteja nesse mundo para entregar resultados, mesmo que eles sejam para você mesmo. Somos mais que isso. Somos mais que números. Criar métricas de comparação, as famosas redes sociais, onde nos imaginamos na vida do outro será um mal que demoraremos para eliminar. É preciso entender que não temos vidas, realidades e visões de mundo iguais. Nossas vidas não são como empresas que tem objetivos claros. São caminhos tortuosos que nem sempre nos levam onde queremos e olha só: talvez isso seja bom. :-)

P.s.: Se você leu os livros, acho que tem um seção de comentários aqui. Comente! Se não tiver comenta em algum lugar.

P.s2.: Livros de Byung-Chul-Hang:

https://www.amazon.com.br/s?k=byung-chul+han&__mk_pt_BR=ÅMÅŽÕÑ&crid=24QUI4IUOA6VW&sprefix=byung%2Caps%2C171&ref=nb_sb_ss_i_1_4

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